Ainda em clima de Olimpíadas, muita gente quer saber por que alguns veículos de comunicação usam os termos “paralimpíada” e “paralímpico” em vez de “paraolimpíada” e “paraolímpico”, conforme consta no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa – VOLP. Para tentar esclarecer, transcrevo a explicação do Professor Pasquale Cipro Neto, publicada em sua coluna no jornal Folha de São Paulo – jornal on-line, no dia 06 de setembro e que reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema e sobre o Acordo Ortográfico.
“Paralímpico? Haja bobagem e submissão!” O meu querido amigo, vizinho, filho e irmão Márcio Ribeiro me pergunta, com o seu falar italianado e com influência do linguajar da Casa Verde, bairro paulistano em que passou boa parte da vida:
“Mas que história é essa de “paralímpico”? “Emburreci, emburrecemos todos?”. E não foi só o Márcio. Vários leitores escreveram diretamente para o jornal ou para mim para pedir explicações. Não, meu caro Márcio, não emburreceste. Nem tu nem os leitores que se manifestaram. E, é bom que se diga logo, a Folha não embarcou nessa canoa furadésima, furadissíssima. Parece que o Comitê Paralímpico Brasileiro adotou a forma “paralímpico” para se aproximar da grafia do nome do comitê internacional (“paralympic”). Por sinal, o de Portugal também emprega essa aberração –o deles se chama “Comité Paralímpico de Portugal” (com acento agudo mesmo em “comité”). É bom lembrar que o “par(a)-” da legítima forma portuguesa “paraolímpico” vem do grego, em que, de acordo com o “Houaiss”, tem o sentido de “junto; ao lado de; ao longo de; para além de”. Na nossa língua, ainda de acordo com o “Houaiss”, esse prefixo ocorre com o sentido de “proximidade” (“paratireoide”, “parágrafo”), de “oposição” (“paradoxo”), de “para além de” (“parapsicologia”), de “distúrbio” (“paraplegia”, “paralexia”) ou de “semelhança” (“parastêmone”). Os jogos são paraolímpicos porque são disputados à semelhança dos olímpicos.
Talvez seja desnecessário lembrar que esse “par(a)-” nada tem que ver com o “para” de “paraquedas” ou “para-raios”, que é do verbo “parar” (não esqueçamos que o infame “Desacordo Ortográfico” eliminou o acento agudo da forma verbal “para”). Pois bem. A formação de “paraolímpico” é semelhante à de termos como “gastroenterologista”, “gastroenterite”, “hidroelétrico/a”, “socioeconômico”, das quais existem formas variantes, em que sesuprime a vogal/fonema final do primeiro elemento (mas nunca a vogal/fonema inicial do segundo elemento): “gastrenterologista”, “gastrenterite”, “hidrelétrico/a”, “socieconômico”. O uso não registra preferência por um determinado tipo de processo: se tomarmos a dupla “hidroelétrico/hidrelétrico”, por exemplo, veremos que a mais usada sem dúvida é a segunda; se tomarmos “socioeconômico/socieconômico”, veremos que a vitória é da primeira. No par 'gastroenterologista/gastrenterologista', a primeira é a mais usada, embora seja abreviada apenas para 'gastro'.
O fato é que em português poderíamos perfeitamente ter também a forma “parolímpico”, mas nunca “paralímpico”, que, pelo jeito, não passa de macaquice, explicitação do invencível complexo de vira-lata (como dizia o grande Nélson Rodrigues). Pelo que sei, em inglês… Agora não importa. Alta fonte de uma das nossas mais importantes emissoras de rádio me disse que o Comitê Paralímpico Brasileiro fez pressão para que a emissora adotasse a bobagem, digo, a forma americanizada, americanalhada seja lá o que for. A farsa é tão grande que, em algumas emissoras de rádio e de TV, os repórteres (que seguem ordens superiores) se esforçam para pronunciar a aberração, mas os atletas paraolímpicos logo se encarregam de pôr as coisas nos devidos lugares, já que, quando entrevistados, dão de ombros para a bobagem recém-pronunciada pelo entrevistador e dizem “paraolímpico”, “paraolimpíada/s”.
É o mesmo elemento de 'paramédicos', 'paramilitares' e 'paranormal', e não o de 'para-choques' e 'para-brisa'.
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