Leitor pergunta sobre as respostas na oração eucarística
12 anos agoAdd Commentby Veritatis Splendor
Queridos Irmãos, a Paz do Senhor.
Gostaria de esclarecer uma dúvida referente a Oração Eucarística:
As rubricas dizem que ela deve ser recitada somente pelo sacerdote, bispo ou presbítero, não por um diácono, leigo ou ministro extraordinário da comunhão.
No entanto, no Brasil, são recitadas pelos fiéis as chamadas “respostas” após cada parágrafo (por exemplo, na Oração Eucarística II: santificai nossa oferenda ó Senhor, recebei ó Senhor a nossa oferta, fazei de nós um só corpo e um só espírito, lembrai-vos ó Pai da Vossa Igreja, lembrai-vos ó Pai dos Vossos filhos, concedei-nos o convívio dos eleitos…) O que me chamou atenção é que estas intervenções não estão prescritas no Ordinário da Missa apresentado pela Santa Sé. É lícito recitá-las? De onde elas surgiram? Grato, Odair.
Caríssimo sr. Odair, estimado em Cristo Jesus,
Muito agradeço sua pergunta, que nos dá oportunidade de discorrermos, ainda que brevemente, sobre alguns aspectos desse tema tão rico que é a nossa sagrada liturgia romana.
Realmente, a Oração Eucarística (ou Anáfora) é própria do sacerdote, dado sua função eminentemente sacrifical. É no contexto da Oração Eucarística que se dá a Consagração, i.e., que o pão e o vinho se mudam em Corpo e Sangue de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, tornando novamente presente, diante de nós, o Seu sacrifício, oferecido ao Pai de uma vez por todas, na Cruz do Calvário, pela nossa salvação. Tal é o centro da celebração eucarística, o ápice, sua parte essencial, sem a qual não há Missa. Ora, bem sabemos que quem oferece a Missa é o sacerdote, pois, pelo sacramento da Ordem, está de tal modo incorporado a Cristo, que age não só em Seu nome, mas em Sua divina e adorável Pessoa. O sacerdote é, pois, um outro Cristo e faz Suas vezes na renovação da Cruz que é a Santa Missa. O sacerdote, logo, é aquele que, por agir in Persona Christi, recita as palavras da Consagração e reza toda a Oração Eucarística que a contextualiza.
Além do mais, na Oração Eucarística estão explicitadas as preces pelas quais o sacrifício é oferecido: em ação de graças, em louvor, como impetração etc. Também se fazem as intercessões por todas as classes de pessoas, tornando clara a universalidade objetiva do sacrifício de Jesus (embora a Redenção subjetiva só venha aos eleitos, ou seja, àqueles que, por decisão pessoal em resposta à graça, vivam conforme a vontade de Deus), e demonstrando a catolicidade e a unidade da Igreja, fora da qual não há salvação.
As rubricas, e também a Instrução Geral do Missal Romano, são claras ao afirmar que só o sacerdote reza a Oração Eucarística, em suas variadas modalidades. O senhor está certo. E nada pode alterar tal norma, sob pena de não só desobedecermos a uma norma clara da Santa Sé como de ferir a própria fé no caráter sacrifical da Santa Missa.
Ora, no Brasil há uma previsão para que, após algumas preces da Oração Eucarística, o povo proclame certos responsos. E é essa a sua dúvida: se tais respostas são lícitas.
Na versão típica em latim do Missal Romano, como o senhor mesmo observa, elas não existem. O sacerdote recita a Oração Eucarística sem interrupções. O povo só intervém em poucos momentos: no diálogo inicial antes do Prefácio (“O Senhor esteja convosco: – Ele está no meio de nós”;”Corações ao alto: O nosso coração está em Deus”; “Demos graças ao Senhor, nosso Deus: É o nosso dever e a nossa salvação”), na aclamação memorial após a Consagração e na resposta após a Doxologia final que encerra a Oração Eucarística. Aliás, à exceção da segunda, que só foi incorporada ao Missal com a reforma de Paulo VI, em 1969, as demais intervenções são clássicas no rito romano, sempre nele presentes desde antes mesmo de São Gregório Magno, que lhe deu a forma básica mais tarde codificada e sistematizada por São Pio V.
As respostas após algumas preces, no caso, após a epiclese, após a oblação, após a segunda epiclese e após as intercessões, então, são criação brasileira. Todavia, embora isso, foram tais aprovadas pela Santa Sé quando da apresentação da edição em português, pela CNBB, do Missal Romano. A Igreja, em 1970, após a Reforma Litúrgica pós-Concílio Vaticano II, então, aprovou que se faça tais respostas, sendo, portanto, facultativas.
Nesse sentido, algumas dúvidas poderiam surgir. Não seriam elas uma violação da norma que proíbe os fiéis de recitar a Oração Eucarística? Além disso, não seria uma clara demonstração de falta de fé no caráter sacrifical da Missa pela presença de leigos rezando uma oração propriamente sacerdotal?
Não o cremos. Primeiro porque o Papa é o supremo legislador da Igreja – desde que não contrarie a Lei de Deus e a lei natural – e, conforme o Direito Canônico, o máximo intérprete das leis eclesiásticas. A lei da Igreja deve ser interpretada de modo coerente e harmônico. O mesmo Papa não proibiria uma coisa que, noutro decreto, autorizaria. Se o fizesse, entretanto, seria uma revogação, o que, aliás, ele bem poderia fazer. Não o fez e não é esse o caso, até porque a matéria envolve não só legislação mas doutrina, terreno no qual o Papa, ainda quando fora das condições do exercício de sua infalibilidade, goza da assistência prudencial certa do Espírito Santo.
Pois bem, tais respostas do povo, durante a Oração Eucarística, aprovadas pela Santa Sé em nome do Papa, são, portanto, lícitas e, formalmente, não contrariam a proibição dos leigos de recitar o Cânon. Materialmente, também podemos constatar que, com tais respostas, os leigos não estão rezando a Oração Eucarística, pois elas não fazem parte desta. Sim, esta é a verdade: as respostas do povo a determinados momentos da Oração Eucarística não são a Oração Eucarística, não são o texto da Oração Eucarística, não fazem parte da Oração Eucarística. A cada resposta do povo, a Oração Eucarística é como que interrompida para os responsórios dos fiéis. Nesse diapasão, a rubrica permanece intacta e a doutrina não é violada.
Entretanto, dois reparos merecem ser feitos.
Primeiramente, a autorização dada pela Santa Sé foi ad experimentum e, pois, se expiraria após a aprovação de um novo Missal, o que, de fato, ocorreu com a promulgação da terceira edição típica latina do Missale Romanum, em 2002. Assim, a entrada em vigor de uma nova edição do Missal faz cair todas as concessões experimentais e temporárias feitas pela Sé Apostólica.
Disputa-se, entre os canonistas e liturgistas, se só a aprovação da edição típica em latim já teria força legal suficiente para fazer cessar uma autorização ad experimentum válida para uma edição anterior do Missal, ou se, para o mesmo efeito, dever-se-ia esperar a aprovação, pela Santa Sé, da nova tradução do Missal local, em vernáculo. Estou pela primeira opinião, confirmada por alguns oficiais e peritos da Sagrada Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, em conversas informais comigo, e também pela própria lógica jurídica: a lei válida é a latina, até porque a edição do Missal nesse idioma é a considerada típíca. Prevalecendo essa tese, majoritária, ademais, a autorização para a interrupção da Oração Eucarística, a fim de que os fiéis leigos proclamem as respostas criadas pela CNBB, está revogada desde a entrada em vigor da nova edição do Missal em latim, em 2002. Mesmo que constem do Missal atualmente em vigor no Brasil, que corresponde à segunda edição em latim, tais respostas devem ser desconsideradas, por serem concedidas apenas ad experimentum.
Em segundo lugar, a própria autorização da Santa Sé, em que pese deva ser sempre obedecida, por ato supremo de governo, não é isenta de críticas, sempre pautadas na caridade e no respeito devido aos superiores. Ato de governo pode ser criticado, mesmo que, se não contrariar a a lei superior, a Lei divina e a lei natural, deva ser obedecido. Desse modo, a autorização da Santa Sé às insersão, no Missal, das respostas elaboradas por liturgistas da CNBB, pode ser criticada.
A participação do povo nesse momento, mesmo que seja uma interrupção da Oração Eucarística, é estranha à mentalidade do rito romano. Não faz parte de seu desenvolvimento orgânico. A própria presença das mesmas somente no Missal brasileiro o prova, além da sua elaboração em uma época em que não poucos assessores da CNBB – não os Senhores Bispos, frise-se, ainda que alguns deles também, infelizmente – estavam comprometidos com o progressismo litúrgico, com o pensamento modernista, com a dessacralização da liturgia e com a descaracterização de nosso rito tão belo e santo. Some-se a isso que as respostas inseridas ou são supérfluas – não tendo nenhuma função prática ou espiritual na cerimônia -, ou são superficiais – o que denota também a tentativa, inconsciente ou não, de certa mundanização da liturgia ou inadequada popularização. Mais ainda: as respostas feitas pelo povo, interrompendo-se, a cada parágrafo, a Oração Eucarística, induz à idéia de que os leigos a estão rezando com o sacerdote – como o senhor mesmo, caríssimo consulente -, o que diminui a percepção de que se está diante de um ato sacrifical por excelência, impedindo a real consciência desse momento em que Cristo por nós Se imola, e mesmo cria, nas almas, a sensação de que não existe real diferença de essência entre o sacerdócio hierárquico e aquele comum dos fiéis.
Diante do exposto, a recomendação prática que lhe dou é a diretriz que sigo: não respondo em tais momentos, mesmo que o restante da assembléia o faça.
Espero ter ajudado.
Pode um seminarista, fazer a oração eucarisica? Na minha paróquia o padre permitiu.
Caríssimo Maurício,
PAX DOMINI,
A própria definição do que é Oração Eucarística responde o seu questionamento. Vejamos, a Instrução Geral sobre o Missal Romano (em latim: Institutio Generalis Missalis Romani), diz;
“na oração eucarística rendem-se graças a Deus por toda obra salvífica e o pão e vinho tornam-se o Corpo e o Sangue de Cristo.” (IGMR 48).
“A oração eucarística é o centro e ápice de toda celebração, é prece de ação de graças e santificação. O sacerdote convida o povo a elevar os corações ao Senhor na oração e na ação de graças e o associa à prece que dirige a Deus Pai por Jesus Cristo em nome de toda comunidade. O sentido desta oração é que toda a assembléia se una com Cristo na proclamação das maravilhas de Deus e na oblação do sacrifício” (IGMR 54).
Como é perceptível, a Oração Eucarística é o ápice da celebração. Onde através de Cristo nós vivenciamos a profundidade do mistério salvífico. A XI Assembléia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, tendo como tema “A Eucaristia; Fonte e Ápice da Vida e da Missão da Igreja”, reunida na Cidade do Vaticano, lembrou que a “A Igreja de Cristo une-se a essa oferta na anáfora ou Oração Eucarística. Essa oferta, embora de maneira incruenta, não é nova, mas é a mesma que se realizou sobre a Cruz. É esse o sentido da observação feita pela referida Encíclica: “A Missa torna presente o sacrifício da Cruz; não é mais um, nem o multiplica (Ecclesia de Eucharistia)“
Ora, na Oração Eucarística se encontra a Ação de Graças, a invocação do Espírito Santo, a Consagração, a Doxologia. Tudo embebido na mística sacrificial que é a Santa Missa. Um seminarista não tem poder para tamanha investidura.
Caros irmãos do Esplendor da Verdade
Dia 12 Jun 07, véspera do dia de Santo Antônio, fui assistir a Santa Missa com a Trezena do Santo, na Catedral da Cidade de Campo Grande, MS. No momento da Oração Eucarística após a Consagração, o Padre celebrante cedeu a parte para o Diácono recitar trechos da Oração Eucarística. É normal este procedimento no Missal Romano?
PAZ E BEM
Caríssimo sr. André,
Obrigado pela mensagem.
Repetindo o que escrevi em outra resposta:
Realmente, a Oração Eucarística (ou Anáfora) é própria do sacerdote, dado sua função eminentemente sacrifical. É no contexto da Oração Eucarística que se dá a Consagração, i.e., que o pão e o vinho se mudam em Corpo e Sangue de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, tornando novamente presente, diante de nós, o Seu sacrifício, oferecido ao Pai de uma vez por todas, na Cruz do Calvário, pela nossa salvação. Tal é o centro da celebração eucarística, o ápice, sua parte essencial, sem a qual não há Missa. Ora, bem sabemos que quem oferece a Missa é o sacerdote, pois, pelo sacramento da Ordem, está de tal modo incorporado a Cristo, que age não só em Seu nome, mas em Sua divina e adorável Pessoa. O sacerdote é, pois, um outro Cristo e faz Suas vezes na renovação da Cruz que é a Santa Missa. O sacerdote, logo, é aquele que, por agir in Persona Christi, recita as palavras da Consagração e reza toda a Oração Eucarística que a contextualiza.
Além do mais, na Oração Eucarística estão explicitadas as preces pelas quais o sacrifício é oferecido: em ação de graças, em louvor, como impetração etc. Também se fazem as intercessões por todas as classes de pessoas, tornando clara a universalidade objetiva do sacrifício de Jesus (embora a Redenção subjetiva só venha aos eleitos, ou seja, àqueles que, por decisão pessoal em resposta à graça, vivam conforme a vontade de Deus), e demonstrando a catolicidade e a unidade da Igreja, fora da qual não há salvação.
As rubricas, e também a Instrução Geral do Missal Romano, são claras ao afirmar que só o sacerdote reza a Oração Eucarística, em suas variadas modalidades.
Ora, o diácono é ordenado para o serviço, não para o sacerdócio. Embora, pelo sacramento da Ordem, esteja, de modo especial, incorporado a Cristo, diferindo dos leigos não só em grau, mas em essência, essa incorporação não lhe dá o sacerdócio, conferido apenas pela ordenação presbiteral. O diácono é clérigo, porém não é sacerdote. Mesmo que recitasse a Oração Eucarística, mesmo que recitasse a própria Consagração, nenhum efeito se produziria. Não se trata de uma proibição apenas, e sim de uma consequência lógica da fé da Igreja: se a Missa é sacrifício, só o sacerdote pode oferecê-la, e o diácono, embora não seja leigo, tampouco é sacerdote.
O que esse padre fez, cedendo parte da Oração Eucarística a um não-sacerdote é um delito gravíssimo, e deve ser denunciado ao Bispo. Não resolvendo a situação, é o caso de ir à Santa Sé, como nos pede o Papa pela Redemptionis Sacramentum.
Mais ainda: há motivo para desconfiar da validade da Missa. Não digo licitude, pois evidentemente, tal Missa é ilicitamente oferecida, mas validade mesmo. Se o padre entregou a um diácono parte da Oração Eucarística pode ser que não entenda a Missa como sacrifício, não se veja como essencialmente diferente dos demais, havendo falta de intenção. Ora, a intenção de fazer o que a Igreja quer – ainda que sem fé no que a Igreja ensina – é elemento intrínseco para a validade do sacramento. Veja o senhor: não é apenas uma falta de fé na Missa como sacrifício – se a validade do sacramento dependesse da adesão dos padres à doutrina, não estaríamos seguros, e a Igreja já condenou o donatismo, explicando que, independentemente da fé ou dos costumes do ministro, o sacramento se realiza pela ação do Espírito Santo, presentes os elementos da validade -, não é, repito, uma falta de fé na Missa como sacrifício, mas uma falta de intenção de celebrar o que a Igreja deseja.
Evidentemente, a intenção está no interior, e não podemos julgar da mesma com absoluta certeza. Contudo, aspectos exteriores podem nos indicar o que se passa no interior de alguém, ou, ao menos, nos fazer desconfiar de algo.
12 anos agoAdd Commentby Veritatis Splendor
Queridos Irmãos, a Paz do Senhor.
Gostaria de esclarecer uma dúvida referente a Oração Eucarística:
As rubricas dizem que ela deve ser recitada somente pelo sacerdote, bispo ou presbítero, não por um diácono, leigo ou ministro extraordinário da comunhão.
No entanto, no Brasil, são recitadas pelos fiéis as chamadas “respostas” após cada parágrafo (por exemplo, na Oração Eucarística II: santificai nossa oferenda ó Senhor, recebei ó Senhor a nossa oferta, fazei de nós um só corpo e um só espírito, lembrai-vos ó Pai da Vossa Igreja, lembrai-vos ó Pai dos Vossos filhos, concedei-nos o convívio dos eleitos…) O que me chamou atenção é que estas intervenções não estão prescritas no Ordinário da Missa apresentado pela Santa Sé. É lícito recitá-las? De onde elas surgiram? Grato, Odair.
Caríssimo sr. Odair, estimado em Cristo Jesus,
Muito agradeço sua pergunta, que nos dá oportunidade de discorrermos, ainda que brevemente, sobre alguns aspectos desse tema tão rico que é a nossa sagrada liturgia romana.
Realmente, a Oração Eucarística (ou Anáfora) é própria do sacerdote, dado sua função eminentemente sacrifical. É no contexto da Oração Eucarística que se dá a Consagração, i.e., que o pão e o vinho se mudam em Corpo e Sangue de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, tornando novamente presente, diante de nós, o Seu sacrifício, oferecido ao Pai de uma vez por todas, na Cruz do Calvário, pela nossa salvação. Tal é o centro da celebração eucarística, o ápice, sua parte essencial, sem a qual não há Missa. Ora, bem sabemos que quem oferece a Missa é o sacerdote, pois, pelo sacramento da Ordem, está de tal modo incorporado a Cristo, que age não só em Seu nome, mas em Sua divina e adorável Pessoa. O sacerdote é, pois, um outro Cristo e faz Suas vezes na renovação da Cruz que é a Santa Missa. O sacerdote, logo, é aquele que, por agir in Persona Christi, recita as palavras da Consagração e reza toda a Oração Eucarística que a contextualiza.
Além do mais, na Oração Eucarística estão explicitadas as preces pelas quais o sacrifício é oferecido: em ação de graças, em louvor, como impetração etc. Também se fazem as intercessões por todas as classes de pessoas, tornando clara a universalidade objetiva do sacrifício de Jesus (embora a Redenção subjetiva só venha aos eleitos, ou seja, àqueles que, por decisão pessoal em resposta à graça, vivam conforme a vontade de Deus), e demonstrando a catolicidade e a unidade da Igreja, fora da qual não há salvação.
As rubricas, e também a Instrução Geral do Missal Romano, são claras ao afirmar que só o sacerdote reza a Oração Eucarística, em suas variadas modalidades. O senhor está certo. E nada pode alterar tal norma, sob pena de não só desobedecermos a uma norma clara da Santa Sé como de ferir a própria fé no caráter sacrifical da Santa Missa.
Ora, no Brasil há uma previsão para que, após algumas preces da Oração Eucarística, o povo proclame certos responsos. E é essa a sua dúvida: se tais respostas são lícitas.
Na versão típica em latim do Missal Romano, como o senhor mesmo observa, elas não existem. O sacerdote recita a Oração Eucarística sem interrupções. O povo só intervém em poucos momentos: no diálogo inicial antes do Prefácio (“O Senhor esteja convosco: – Ele está no meio de nós”;”Corações ao alto: O nosso coração está em Deus”; “Demos graças ao Senhor, nosso Deus: É o nosso dever e a nossa salvação”), na aclamação memorial após a Consagração e na resposta após a Doxologia final que encerra a Oração Eucarística. Aliás, à exceção da segunda, que só foi incorporada ao Missal com a reforma de Paulo VI, em 1969, as demais intervenções são clássicas no rito romano, sempre nele presentes desde antes mesmo de São Gregório Magno, que lhe deu a forma básica mais tarde codificada e sistematizada por São Pio V.
As respostas após algumas preces, no caso, após a epiclese, após a oblação, após a segunda epiclese e após as intercessões, então, são criação brasileira. Todavia, embora isso, foram tais aprovadas pela Santa Sé quando da apresentação da edição em português, pela CNBB, do Missal Romano. A Igreja, em 1970, após a Reforma Litúrgica pós-Concílio Vaticano II, então, aprovou que se faça tais respostas, sendo, portanto, facultativas.
Nesse sentido, algumas dúvidas poderiam surgir. Não seriam elas uma violação da norma que proíbe os fiéis de recitar a Oração Eucarística? Além disso, não seria uma clara demonstração de falta de fé no caráter sacrifical da Missa pela presença de leigos rezando uma oração propriamente sacerdotal?
Não o cremos. Primeiro porque o Papa é o supremo legislador da Igreja – desde que não contrarie a Lei de Deus e a lei natural – e, conforme o Direito Canônico, o máximo intérprete das leis eclesiásticas. A lei da Igreja deve ser interpretada de modo coerente e harmônico. O mesmo Papa não proibiria uma coisa que, noutro decreto, autorizaria. Se o fizesse, entretanto, seria uma revogação, o que, aliás, ele bem poderia fazer. Não o fez e não é esse o caso, até porque a matéria envolve não só legislação mas doutrina, terreno no qual o Papa, ainda quando fora das condições do exercício de sua infalibilidade, goza da assistência prudencial certa do Espírito Santo.
Pois bem, tais respostas do povo, durante a Oração Eucarística, aprovadas pela Santa Sé em nome do Papa, são, portanto, lícitas e, formalmente, não contrariam a proibição dos leigos de recitar o Cânon. Materialmente, também podemos constatar que, com tais respostas, os leigos não estão rezando a Oração Eucarística, pois elas não fazem parte desta. Sim, esta é a verdade: as respostas do povo a determinados momentos da Oração Eucarística não são a Oração Eucarística, não são o texto da Oração Eucarística, não fazem parte da Oração Eucarística. A cada resposta do povo, a Oração Eucarística é como que interrompida para os responsórios dos fiéis. Nesse diapasão, a rubrica permanece intacta e a doutrina não é violada.
Entretanto, dois reparos merecem ser feitos.
Primeiramente, a autorização dada pela Santa Sé foi ad experimentum e, pois, se expiraria após a aprovação de um novo Missal, o que, de fato, ocorreu com a promulgação da terceira edição típica latina do Missale Romanum, em 2002. Assim, a entrada em vigor de uma nova edição do Missal faz cair todas as concessões experimentais e temporárias feitas pela Sé Apostólica.
Disputa-se, entre os canonistas e liturgistas, se só a aprovação da edição típica em latim já teria força legal suficiente para fazer cessar uma autorização ad experimentum válida para uma edição anterior do Missal, ou se, para o mesmo efeito, dever-se-ia esperar a aprovação, pela Santa Sé, da nova tradução do Missal local, em vernáculo. Estou pela primeira opinião, confirmada por alguns oficiais e peritos da Sagrada Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, em conversas informais comigo, e também pela própria lógica jurídica: a lei válida é a latina, até porque a edição do Missal nesse idioma é a considerada típíca. Prevalecendo essa tese, majoritária, ademais, a autorização para a interrupção da Oração Eucarística, a fim de que os fiéis leigos proclamem as respostas criadas pela CNBB, está revogada desde a entrada em vigor da nova edição do Missal em latim, em 2002. Mesmo que constem do Missal atualmente em vigor no Brasil, que corresponde à segunda edição em latim, tais respostas devem ser desconsideradas, por serem concedidas apenas ad experimentum.
Em segundo lugar, a própria autorização da Santa Sé, em que pese deva ser sempre obedecida, por ato supremo de governo, não é isenta de críticas, sempre pautadas na caridade e no respeito devido aos superiores. Ato de governo pode ser criticado, mesmo que, se não contrariar a a lei superior, a Lei divina e a lei natural, deva ser obedecido. Desse modo, a autorização da Santa Sé às insersão, no Missal, das respostas elaboradas por liturgistas da CNBB, pode ser criticada.
A participação do povo nesse momento, mesmo que seja uma interrupção da Oração Eucarística, é estranha à mentalidade do rito romano. Não faz parte de seu desenvolvimento orgânico. A própria presença das mesmas somente no Missal brasileiro o prova, além da sua elaboração em uma época em que não poucos assessores da CNBB – não os Senhores Bispos, frise-se, ainda que alguns deles também, infelizmente – estavam comprometidos com o progressismo litúrgico, com o pensamento modernista, com a dessacralização da liturgia e com a descaracterização de nosso rito tão belo e santo. Some-se a isso que as respostas inseridas ou são supérfluas – não tendo nenhuma função prática ou espiritual na cerimônia -, ou são superficiais – o que denota também a tentativa, inconsciente ou não, de certa mundanização da liturgia ou inadequada popularização. Mais ainda: as respostas feitas pelo povo, interrompendo-se, a cada parágrafo, a Oração Eucarística, induz à idéia de que os leigos a estão rezando com o sacerdote – como o senhor mesmo, caríssimo consulente -, o que diminui a percepção de que se está diante de um ato sacrifical por excelência, impedindo a real consciência desse momento em que Cristo por nós Se imola, e mesmo cria, nas almas, a sensação de que não existe real diferença de essência entre o sacerdócio hierárquico e aquele comum dos fiéis.
Diante do exposto, a recomendação prática que lhe dou é a diretriz que sigo: não respondo em tais momentos, mesmo que o restante da assembléia o faça.
Espero ter ajudado.
Pode um seminarista, fazer a oração eucarisica? Na minha paróquia o padre permitiu.
Caríssimo Maurício,
PAX DOMINI,
A própria definição do que é Oração Eucarística responde o seu questionamento. Vejamos, a Instrução Geral sobre o Missal Romano (em latim: Institutio Generalis Missalis Romani), diz;
“na oração eucarística rendem-se graças a Deus por toda obra salvífica e o pão e vinho tornam-se o Corpo e o Sangue de Cristo.” (IGMR 48).
“A oração eucarística é o centro e ápice de toda celebração, é prece de ação de graças e santificação. O sacerdote convida o povo a elevar os corações ao Senhor na oração e na ação de graças e o associa à prece que dirige a Deus Pai por Jesus Cristo em nome de toda comunidade. O sentido desta oração é que toda a assembléia se una com Cristo na proclamação das maravilhas de Deus e na oblação do sacrifício” (IGMR 54).
Como é perceptível, a Oração Eucarística é o ápice da celebração. Onde através de Cristo nós vivenciamos a profundidade do mistério salvífico. A XI Assembléia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, tendo como tema “A Eucaristia; Fonte e Ápice da Vida e da Missão da Igreja”, reunida na Cidade do Vaticano, lembrou que a “A Igreja de Cristo une-se a essa oferta na anáfora ou Oração Eucarística. Essa oferta, embora de maneira incruenta, não é nova, mas é a mesma que se realizou sobre a Cruz. É esse o sentido da observação feita pela referida Encíclica: “A Missa torna presente o sacrifício da Cruz; não é mais um, nem o multiplica (Ecclesia de Eucharistia)“
Ora, na Oração Eucarística se encontra a Ação de Graças, a invocação do Espírito Santo, a Consagração, a Doxologia. Tudo embebido na mística sacrificial que é a Santa Missa. Um seminarista não tem poder para tamanha investidura.
Caros irmãos do Esplendor da Verdade
Dia 12 Jun 07, véspera do dia de Santo Antônio, fui assistir a Santa Missa com a Trezena do Santo, na Catedral da Cidade de Campo Grande, MS. No momento da Oração Eucarística após a Consagração, o Padre celebrante cedeu a parte para o Diácono recitar trechos da Oração Eucarística. É normal este procedimento no Missal Romano?
PAZ E BEM
Caríssimo sr. André,
Obrigado pela mensagem.
Repetindo o que escrevi em outra resposta:
Realmente, a Oração Eucarística (ou Anáfora) é própria do sacerdote, dado sua função eminentemente sacrifical. É no contexto da Oração Eucarística que se dá a Consagração, i.e., que o pão e o vinho se mudam em Corpo e Sangue de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, tornando novamente presente, diante de nós, o Seu sacrifício, oferecido ao Pai de uma vez por todas, na Cruz do Calvário, pela nossa salvação. Tal é o centro da celebração eucarística, o ápice, sua parte essencial, sem a qual não há Missa. Ora, bem sabemos que quem oferece a Missa é o sacerdote, pois, pelo sacramento da Ordem, está de tal modo incorporado a Cristo, que age não só em Seu nome, mas em Sua divina e adorável Pessoa. O sacerdote é, pois, um outro Cristo e faz Suas vezes na renovação da Cruz que é a Santa Missa. O sacerdote, logo, é aquele que, por agir in Persona Christi, recita as palavras da Consagração e reza toda a Oração Eucarística que a contextualiza.
Além do mais, na Oração Eucarística estão explicitadas as preces pelas quais o sacrifício é oferecido: em ação de graças, em louvor, como impetração etc. Também se fazem as intercessões por todas as classes de pessoas, tornando clara a universalidade objetiva do sacrifício de Jesus (embora a Redenção subjetiva só venha aos eleitos, ou seja, àqueles que, por decisão pessoal em resposta à graça, vivam conforme a vontade de Deus), e demonstrando a catolicidade e a unidade da Igreja, fora da qual não há salvação.
As rubricas, e também a Instrução Geral do Missal Romano, são claras ao afirmar que só o sacerdote reza a Oração Eucarística, em suas variadas modalidades.
Ora, o diácono é ordenado para o serviço, não para o sacerdócio. Embora, pelo sacramento da Ordem, esteja, de modo especial, incorporado a Cristo, diferindo dos leigos não só em grau, mas em essência, essa incorporação não lhe dá o sacerdócio, conferido apenas pela ordenação presbiteral. O diácono é clérigo, porém não é sacerdote. Mesmo que recitasse a Oração Eucarística, mesmo que recitasse a própria Consagração, nenhum efeito se produziria. Não se trata de uma proibição apenas, e sim de uma consequência lógica da fé da Igreja: se a Missa é sacrifício, só o sacerdote pode oferecê-la, e o diácono, embora não seja leigo, tampouco é sacerdote.
O que esse padre fez, cedendo parte da Oração Eucarística a um não-sacerdote é um delito gravíssimo, e deve ser denunciado ao Bispo. Não resolvendo a situação, é o caso de ir à Santa Sé, como nos pede o Papa pela Redemptionis Sacramentum.
Mais ainda: há motivo para desconfiar da validade da Missa. Não digo licitude, pois evidentemente, tal Missa é ilicitamente oferecida, mas validade mesmo. Se o padre entregou a um diácono parte da Oração Eucarística pode ser que não entenda a Missa como sacrifício, não se veja como essencialmente diferente dos demais, havendo falta de intenção. Ora, a intenção de fazer o que a Igreja quer – ainda que sem fé no que a Igreja ensina – é elemento intrínseco para a validade do sacramento. Veja o senhor: não é apenas uma falta de fé na Missa como sacrifício – se a validade do sacramento dependesse da adesão dos padres à doutrina, não estaríamos seguros, e a Igreja já condenou o donatismo, explicando que, independentemente da fé ou dos costumes do ministro, o sacramento se realiza pela ação do Espírito Santo, presentes os elementos da validade -, não é, repito, uma falta de fé na Missa como sacrifício, mas uma falta de intenção de celebrar o que a Igreja deseja.
Evidentemente, a intenção está no interior, e não podemos julgar da mesma com absoluta certeza. Contudo, aspectos exteriores podem nos indicar o que se passa no interior de alguém, ou, ao menos, nos fazer desconfiar de algo.
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